Dandão - Brincante da Caceteira, do Carnaval e trabalhador sancristovense |
Thiago Fragata**
Marcos Cardoso, Secretário de Comunicação de Aracaju, ainda
não havia expressado sua opinião acerca da contenda territorial envolvendo São
Cristóvão e Aracaju pelo direito de gestão dos povoados Mosqueiro, Areia
Branca, Robalo, “um naco de terra”, segundo ele. Na semana passada,
aproveitou a decisão do presidente do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), desembargador Paulo Roberto de Oliveira
Lima, devolvendo a região à Capital e formulou um parecer marcado por
uma “idiossincrasia romana” que inspirou esse historiador a escrever essas
linhas. Seu texto me fez lembrar a minha
graduação, onde aprendi que os legisladores da antiga Roma imperialista
fundamentavam no Direito as invasões de territórios “bárbaros”. Era um esforço
de “civilizar” e levar “felicidade” ao povo carente, na sua ignorância, de
ascender à posição de súdito e gozar das beneses da pax romana e/ou do seu modus
vivendus. Vejamos o que diz seu artigo.
Intitulado “São Cristóvão é um município simpático”
reconhece a beleza e importância do patrimônio cultural do lugar, focado na
arquitetura secular dos seus templos religiosos e sobrados, das suas praças
dentre as quais a bela São Francisco, chancelada Patrimônio da Humanidade pela
UNESCO, além do pioneirismo do Cristo Redentor. Em seguida, procura explicar a
sina do atraso ou a “síndrome de João Bebe-Água”, calcada nas lamúrias em razão
da perda do status de capital e da falta de uma alavanca progressista que
reverta a condição de cidade-dormitório, que se transformou após a falência das
fábricas têxteis na década de 1970.
Observa o ilustre secretário que a cidade não é feliz, por
isso sofre, e diagnostica o mal. Primeiro, afirma que na sua História “faltam
cidadãos ilustres”, figurando tão somente passageiros bem sucedidos como o
médico Lourival Baptista, o industrial Augusto Franco, Cristóvão de Barros, o
seu fundador. Segundo, pela sua classe política que se revelou nas últimas
décadas um bando de gestores corruptos ou que se deixaram corromper à frente do
Executivo. A sua conclusão é dedicada ao caso do Mosqueiro e arrabalde,
território de significativos investimentos da prefeitura de Aracaju;
investimentos estes convertidos em escolas, postos de saúde, orla, que
representam a festejada qualidade de vida aracajuana. Para ele, os benefícios
justificam a decisão do desembargador Paulo Roberto
de Oliveira Lima, e deve acalmar o povo da região, que abandonado pelos
gestores sancristovenses vislumbram uma dupla felicidade: usufruir dos serviços
que conferem dignidade e morar numa capital como Aracaju.
No seu desejo de minimizar qualquer importância ocupada por
São Cristóvão, Marcos Cardoso informa que a cidade foi capital por pouco mais
de 30 anos, contando da emancipação política de Sergipe da Bahia em 1820 até o
ano da Mudança da Capital, 1855. Esclareço que por volta de 1820 foi expedido
um decreto imperial “confirmando” a condição da cidade-sede do poder
governamental. Mas São Cristóvão foi fundada em 1590 para “sediar” a Capitania
de Sergipe D'El Rey e manteve essa posição até o ato da Mudança da Capital,
assim perfazendo 265 anos.
Quanto à falta de ilustres sancristovenses na memória do
jornalista que é escritor e um bom pesquisador, penso seja brincadeira.
Desconfio que ele tenha folheado o Dicionário Bio-bibliográfico de Armindo
Guaraná. Cito a obra porque é referência e tratasse de um conjunto de
biografias de ilustrados sergipanos que citam 53 sancristovenses; adendo,
Guaraná nasceu em São Cristóvão. Não tenho espaço para falar da formação e
títulos de tanto ilustrados, citarei os mais conhecidos, aqueles que têm nome
gravado nas vias da Capital: jornalista Apulcro Motta, Ivo do Prado, Pereira
Lobo que foi governador; Siqueira de Menezes, que além de Governador teve
atuação marcante na vitória da Guerra de Canudos; Ananias de Azevedo, Manuel
Dantas, José Augusto Garcez, este considerado pai da museologia sergipana; Frei
Santa Cecília, que deu música ao hino sergipano.
Pra mim é difícil continuar lista de nomes dos tais
ilustres, pois a cada dia procuro pesquisar os populares, os anônimos
destituídos desta pretensa representatividade social cobrada pelo ilustrado
Secretário de Comunicação de Aracaju. Contrariando seu ponto de vista, para mim
os trabalhadores das granjas, das feiras, das empresas que vendem água, da
pesca, da agricultura, enfim, os honoris causa, é que fazem de São
Cristóvão um município simpático, sim senhor.
Acredito que a solução jurídica para o imbróglio gerado a
partir da área litigada entre São Cristóvão e Aracaju seja o plebiscito. Com a
expressão “plebiscito já!” gostaria de afrontar o discurso romano do Secretário
de Comunicação de Aracaju, Marcos Cardoso. Plebiscito é uma votação onde o povo
escolhe, expressa o seu desejo. A palavra vem de plebe, povo, que era o
sustentáculo do poder tanto na antiga Roma quanto na atual democracia. Sabemos
que por muito tempo a participação do povo foi menosprezada em sua importância
tanto na construção das realidades quanto na sustentação do poder instituído.
Sem mais delongas, espero que o Supremo Tribunal Federal
(STF) possa agilizar um plebiscito. Assim o povo decidirá sobre a jurisdição
dos povoados de Mosqueiro, Robalo e Areia Branca, pois nunca o aludido discurso
romano irá concluir “dê a Aracaju o que é de Aracaju e a São Cristóvão o que é
de São Cristóvão”.
* Publicado no JORNAL DO DIA. Aracaju, 24 de maio de 2012, p. 2.
**Thiago Fragata é graduado em História pela UFS, especialista em História Cultural pela mesma instituição e diretor do Museu Histórico de Sergipe (MHS). Email: thiagofragata@gmail.com
**Thiago Fragata é graduado em História pela UFS, especialista em História Cultural pela mesma instituição e diretor do Museu Histórico de Sergipe (MHS). Email: thiagofragata@gmail.com
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