Manoel Ferreira. Foto: Thiago Fragata, 2009. |
Thiago
Fragata*
No
dia 30 de julho, faleceu o Sr. Manoel Ferreira Santos (1922/2015), 93
anos, em sua residência localizada no centro histórico de São
Cristóvão. Compareci ao velório que aconteceu no Museu Histórico
de Sergipe. Os filhos aceitaram a última homenagem desta instituição
que teve o pai como seu primeiro diretor. Entre os anos de 1960 e
1970, Manoel Ferreira geriu o museu instalado no antigo Palácio
Provincial.
O
padre Valtervan
Correia Cruz
afirmou
que o Poder Executivo, se tivesse a ciência dos serviços prestados
por esse cidadão ao município, decretaria luto oficial por 3 dias e
conclamaria toda a cidade, seus estudantes a participar do funeral.
Os
oradores resenharam a trajetória e o carácter do amigo, pai, avô,
poeta, homem público e religioso que foi Manoel Ferreira Santos. O
homenageado trabalhou na Fábrica Sam Christovam, aliás, chegou à
cidade em 1935 para ser apontador no escritório da empresa. Fez
carreira política a partir do operariado e população carente. Foi
deputado estadual pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro);
fundador-proprietário do Restaurante Candangos, que se tornaria a
principal casa de shows da cidade nos anos 1960 a 1970; a última
experiência na seara política foi uma candidatura ao governo do
Estado em 1980. Como deputado estadual defendeu a instalação de
curso ginasial em São Cristóvão e proteção das nascentes dos
rios. Em meados da década de 1990, foi eleito o presidente do
Alcóolicos Anônimos (AA), secção São Cristóvão, onde realizou
mais uma importante contribuição à sociedade sancristovense.
Um
fato desconhecido do público que compareceu as exéquias do poeta
foi o seu papel na criação da marca Quarta cidade mais antiga
do Brasil, como ficaria afamada São Cristóvão a partir de
1967.
As
pesquisas indicam que, até a década de 1960, esse rótulo não
existia, por essa razão não era divulgado nos meios de comunicação.
Ele surge com Manoel Ferreira dos Santos, então diretor do Museu
Histórico de Sergipe. Naquela época, José Calasans, Freire
Ribeiro, Manoel Cabral, Sebrão Sobrinho e até Jorge Amado
vivenciavam a antiga cidade: uns, a trabalho; outros, como exercício
literário ou passeio. Irremediavelmente, visitavam o museu e eram
ciceroneados pelo poeta grandiloquente com suas recepções. Manoel
Cabral, escritor e companheiro de partido de Manoel Ferreira,
recomenda aos turistas: “Guarde a tarde para o Museu e Manoel
Ferreira.”
Voltando
ao rótulo “quarta cidade mais antiga”, tudo começou num
programa de rádio por volta de 1966. Manoel Ferreira foi divulgar a
festa de aniversário do Museu Histórico de Sergipe e expressou que
São Cristóvão era uma das primeiras cidades do Brasil. Nem todos
aceitaram, a afirmação sempre despertou/desperta querelas
bairristas. A interrogação se mantinha nas recepções de turistas
e autoridades, ora ventilada por um leigo, ora por um intelectual, o
que desconfortava o anfitrião.
O
Sr. Manoel Ferreira rememora que seu estudo sobre a História de
Sergipe deu-se com os conselhos e livros de Sebrão Sobrinho. Da
prosa travada com o pesquisador itabaianense, teve a seguinte ideia:
submeter a espinhosa questão ao Conselho Federal de Cultura,
instância do Ministério da Educação. Assim feito, o caso foi
apresentado por Hélio Viana, do Serviço do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (SPHAN), na sessão plenária de 24 de agosto de
1967.
Um
ofício remetido pelo Secretário-Geral do Conselho Federal de
Cultura, Manoel C. Bandeira de Mello, transcrevia o excerto do
parecer final que foi recebido com entusiasmo pelas autoridades
sergipanas. Afirmava: “... não temos dúvida em atestar ser a
cidade de São Cristóvão a quarta cidade do Brasil. Somente a
antecedeu a Cidade de Salvador, a de São Sebastião do Rio de
Janeiro e Filipeia de Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa.”(1)
Esse importante documento, penso, exibido pelas autoridades
sergipanas como a última palavra sobre o assunto (governador,
vice-governador, secretario de cultura do Estado rubricaram-no), não
encerra a questão. Faz-se mister saber o que precisa uma cidade para
receber esse título, ou dito de outra forma, o que definia em termos
coloniais a cidade.
Grosso
modo, o que distinguia vila e freguesia era a assistência espiritual
dispensada pela igreja católica aos colonos. A cidade possuía Casa
da Câmara e Cadeia, paróquia e o reconhecimento da Coroa. Assim,
deu-se com Salvador em 1548 e as primeiras cidades embora não seja
possível lastrear com documentos todos os casos. Sergipe, por
exemplo, ressente-se da ordem enviada por Felipe II ao governador-mor
da Bahia, Cristóvão de Barros, visando a colonizar o território.
São Cristóvão e João Pessoa surgiram no período da União
Ibérica (1580-1640), mantinha-se estreita relação com a Espanha.
Voltando
ao tema central deste artigo, o mote de São Cristóvão “quarta
cidade mais antiga do Brasil”,
percebo que, independentemente do respaldo concedido em 1967, o
mercado do turismo sergipano consolidou a marca em campanhas
publicitárias. Inconteste, ele cumpre os requisitos da boa
propaganda e se encontra relacionado de forma visceral ao nome de
Manoel Ferreira, o poeta onomástico. (continua)
*Artigo publicado no JORNAL DA
CIDADE. Aracaju, ano XLIV, n. 12.922, 1 de agosto de 2015,p. B-6.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe seu comentário sobre essa matéria.