SINVAL PALMEIRA, O ADVOGADO DO PCB

 


POR GILFRANCISCO*

Comecei a recolher os artigos de Sinval Palmeira publicados na imprensa sergipana, a partir de 2004, quando localizei um dos seus primeiros artigos de 1933, ano em que dá início a sua trajetória jornalística na imprensa sergipana, se entendendo até 1935 em diversos jornais da província: Diário da Tarde, Correio de Aracaju, A República, O Estado de Sergipe, Folha Popular, Almanack de Sergipe. Pretendia com todo esse material (vinte textos) organizar um livro, para mostrar aos novos estudiosos sergipanos, parte da sua crítica literária produzida pelo jovem acadêmico simão-diense.

ORIGENS

Nascido em 18 de novembro de 1913 em Simão Dias - Sergipe, Sinval Palmeira Vieira, filho da simão-diense Josepha Ribeiro Vieira (12 de julho de 1891), filha de Vicente José Ribeiro e Maria Marcionila Ribeiro e de Odilon Palmeira Vieira (1889 – Paripiranga – Bahia), filho de Josepha Leopoldina de Andrade. Odilon, membro da maçonaria, atuou como advogado (provisionado) da 2ª Comarca, com sede em Propriá, onde foi orador oficial da Sociedade Recreativa 24 de Outubro. O casal que realizou núpcias em 10 de janeiro de 1912 tiveram os seguintes filhos: Amélia (1912); Sinval Palmeira Vieira (1913-1993); Maria de Lourdes Vieira (1915-1935); Marina (1916); Maria Ester Palmeira Vieira (1917-2004); Altair Ribeiro Palmeira Vieira (1919), José Palmeira Vieira (1921) e Maria Helena Palmeira Bauchwitz (1926), que adquiriu voluntariamente, a nacionalidade norte-americana em novembro de 1926. Odilon, casou-se pela segunda vez com Noêmia Maria Palmeira. Em 1928 Odilon Palmeira Viera fora nomeado pelo Governador do Estado de Sergipe, Manuel Correia Dantas (1927-1930), conforme publicação no Diário Oficial de 5 de dezembro, ao cargo de Promotor Público da Comarca de Lagarto, registra a Gazeta de Sergipe:

Ao recém nomeado enviamos nossos parabéns congratulamos com o povo de Lagarto, porque vai ter um representante do Ministério Público que desempenhará as funções do cargo com justiça e critério.

Mais tarde, em 1933 já se encontrava na 2ª Comarca, com sede na cidade de Propriá, na mesma função de Promotor Público.

FORMAÇÃO

Filho de classe média, foi criado num ambiente de leis, num ambiente urbano, onde apreendera as primeiras letras em escolas do município. Sinval teve nove irmãos, todos estudaram no município. A região de Simão Dias localiza-se no Polígono das secas, com temperatura anual de 24,1 graus Celsius e sua vegetação compreende capoeira, caatinga e campos limpos. Sinval Palmeira conclui o curso secundário no Atheneu Pedro II, em Aracaju. O periódico O Estudante (Órgão Literário Humorístico e Noticioso da Mocidade Estudiosa de Sergipe), Ano I, nº 10, 4 de maio de 1930, dirigido por J. Pinheiro Lobão, registra:

No domingo passado, 27 de abril, houve sessão ordinária na Hora Literária Santo Antônio, para eleição da sua nova diretoria. Depois de apurada a eleição, foi escolhido para dirigir aquela sociedade no ano de 1930, os seguintes cavalheiros: Presidente, o distinto professor Florentino Menezes; Vice-Presidente, Pedro Machado; 1º Secretário, Raimundo Leão; 2º Secretário, José Luduvice; 1º Orador, Godofredo Diniz; 2º Orador o nosso inteligente colega Synval Palmeira; tesoureiro bibliotecário, José da Silva Ribeiro Filho e a comissão de sindicância: Dr. Garcia Rosa, Jaime Galvão, Freire Pinto, Manoelito Campos e João Daniel de Castro.

Desejamos a nova diretoria da utilíssima Hora Literária Santo Antônio, felicidades durante o seu mandato.

ACADÊMICO NA BAHIA

Muito jovem aos 17 anos presta vestibular para a Faculdade Livre de Direito da Bahia, aluno exemplar, conseguiu aprovação em primeiro lugar no vestibular e participa ativamente na luta estudantil, sendo eleito o primeiro Presidente do Diretório Acadêmico, “Rui Barbosa” da Faculdade de Direito, militando no quadro da juventude comunista, combatendo o fascismo e o integralismo.

No início do ano de 1935, Sinval Palmeira era constantemente solicitado por instituições sergipanas, para proferir palestras sobre variados temas. Por exemplo, a de janeiro onde se juntou com mais dois amigos, José Calasans (1915-2001) e Garcia Moreno (1910-1976) no salão do clube social fundado em 1916, Recreio Club, que funcionou na rua da frente e depois na Praça Olímpio Campos. Esses três jovens intelectuais, talentosos moços sergipanos eram constantemente aplaudidos pelo público ouvinte. Nesse evento Calasans fala sobre “De Sangue Del Rey a graça infinda”; Garcia ficou com o tema “Biologia e feminismo” e Sinval Palmeira “Sergipe bem contribuinte”.

Na Faculdade, conhece a colega Maria de Lourdes Borges com quem veio a se casar e ter três filhos: Fred, Vera Maria e Betes. Sinval Palmeira conclui o Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais, no mês de dezembro de 1935 e dias depois, embarca para o Rio de Janeiro.


DOIS JOVENS

Seu colega de curso, José Calasans Brandão da Silva, em artigo publicado em 1935, intitulado Dois Jovens, comenta a participação de dois intelectuais de Sergipe modernos, Sinval Palmeira (1913-1993) e Mário Cabral (1914-2008). Diz o historiador sergipano:

Sinval tem espírito reformista, vive preocupado com as reformas, com as transformações, com as modificações (...) Sinval é orador. Tem palavra fácil, elegância na tribuna, verve, gestos que agradam. (...) Ao Sinval agradara, certamente, ávida agitada do advogado. (...) Sinval que ir bem longe, deseja avançar muito, tem a volúpia de chegar muito além. (...) Sinval fala do equilíbrio interior. É imensamente agradável ouvi-lo, doutrinando o assunto. Mas, de instante a instante, ei-lo desequilibrado interiormente. (...)

E sobre ambos Calasans fecha o artigo:

Dois temperamentos diversos, duas organizações diferentes. Só uma coisa eles têm igualmente apenas existe um ponto de contato entre eles. É que ambos possuem talento. [1]


CAPITAL FEDERAL

Após conclusão do curso de Direito, transfere-se para o Rio de Janeiro aos 22 anos incompletos. Na capital federal não conhece ninguém, inicia-se na carreira de advogado e aos poucos vai se estabelecendo, consolidando sua carreira como advogado e resolve permanecer no Rio de Janeiro. Aprovado no concurso do IAPI – Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários onde exerceu a função de procurador, sendo demitido pelo golpe civil e militar de 1964 através do AI 1 (Ato Institucional nº1. (D. O. 06.10.1964) e suspensão dos direitos políticos (D. O. 14.04.1964).

Entre 1936 a 1982 desempenha atividades profissionais como advogado defendendo operário, presos políticos e sindicalistas oprimidos pelos governos ditatoriais, sem receber qualquer remuneração. Advogado em evidência por defender a legalidade do Partido Comunista, Sinval defendeu muitos perseguidos políticos famosos como Carlos Prestes e outros ligados ao Partido Comunista e passa a figurar entre os membros do Conselho da Associação Internacional de Juristas Democráticos.

ELEIÇÃO

Eleito Deputado Estadual em 1962 pelo Partido Social Trabalhista – PST, com 8.938 votos pelo antigo Estado da Guanabara, cujo mandato foi cassado dois anos depois. Demitido do IAPI, onde exerceu chefia do Serviço Jurídico do Contencioso IAPI, nos revela:

A Revolução me cassou e foi uma indignidade, no meu entender. Eu sempre dizia que viveria mais do que a Revolução, para voltar. Aconteceu isso. Vivi mais do que a Revolução, voltei e me aposentei. Mas durante esse tempo que fiquei fora, desenvolvi a minha atividade empresarial e aprendi outras coisas; fui forçado a fazer outras coisas que também gosto de fazer e mudei de profissão completamente.

Em 1986 candidata-se ao governo do Estado do Rio de Janeiro, pelo Partido Socialista Brasileiro, tendo como vice Rachel Gutierrez. Em 1989 quando o casal Sinval e Maria completou 50 anos de união, familiares prestaram-lhe homenagem realizando uma festa das Bodas de Ouro, tendo como resultado a produção de um vídeo pela Aurora Cinematográfica de aproximadamente 6 minutos, com imagens da festa e do final da campanha para Governador em 1986.

Sinval Palmeira faleceu em 26 de março de 1993, aos oitenta anos e o seu corpo foi sepultado no piso da Capelinha de Santo Antônio da Fazenda Cabana da Ponte, localizada no município de Itororó, sudoeste baiano, mais precisamente na microrregião de Itapetinga.

O PARTIDO COMUNISTA

O militante Sinval Palmeira, incansável defensor das questões comunistas, em 1954 requereu, junto ao Tribunal Superior Eleitoral, a revisão da decisão que cassou o registro do Partido Comunista, no Governo do Presidente Dutra. Defendendo os interesses comunistas, o advogado Sinval Palmeira mostra, em primeiro lugar, mais uma vez, como os comunistas olham a sua existência legal do quadro dos partidos como algo de grandemente vantajoso.

Em 1946, quando todo o país se agitou, e uma pergunta se fazia: - deve ou não ser cassado o registro ao partido comunista? Alguns houve bem-intencionados, que julgavam ser mais vantajoso para a democracia que o PCB agisse às claras, legalmente, em vez de agir na sombra da ilegalidade. O país aguardava o pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça Eleitoral através do Ministro Edgar Costa e Presidente deste Tribunal a distribuição dos autos para sorteio. Vejamos o despacho do Ministro sobre o pedido de revisão da cassação do PCB:

- Posto falte ao signatário da petição de fls. 2 qualidade par requerer em nome do Partido Comunista do Brasil, sob a alegação de ter sido seu delegado perante este Tribunal, por isso que não tem hoje aquele Partido personalidade jurídica, que perdeu, ex-vi do art. 149 do Código Eleitoral, com o cancelamento do seu registro, não podendo, assim fazer-se representar por quem quer que seja; e ainda porque a revisão que pleiteia da Resolução nº 1.941 de 1947, que decretou aquele cancelamento, é recurso não conhecido na legislação eleitoral – deixo, entretanto, de indeferir in limine à mesma petição atendendo a que de tal despacho não cabendo recurso para o Tribunal, subtrairia do seu conhecimento o pedido, que deverá ser ele melhor examinado e afinal decidido, para que à sua decisão se empreste a autoridade de norma a ser observada em casos análogos. Voltem assim, os autos à conclusão, para sorteio do relator. [2]


AMOR E PAIXÃO

Vejamos o depoimento de Maria de Lourdes Borges Palmeira (Liuba), sobre onde e quando o conheceu:

Segundo depoimento de Liuba diz que o conheceu - na Faculdade de Direito da Bahia conheci o meu marido, Sinval Palmeira, eu cursava o primeiro ano e ele o quarto. Ele era de Sergipe e tinha estudado em Salvador”. Quando concluiu o curso em 1935, continua “Sinval veio morar no Rio. Eu fiquei em Salvador concluindo o meu curso. Quando me formei ele foi para Salvador, nos casamos e viemos morar no Rio. Ele já trabalhava no IAPI e abriu um escritório para advogar. Aos poucos, foram surgindo os clientes”. (...) “Não me interessei em trabalhar no escritório, com Sinval. Por um motivo muito simples: quando eu entrei na faculdade, senti que não tinha vocação. Estudei direito porque meu pai tinha vontade de ter um filho advogado. Quando conheci Sinval, eu pensei pronto, este vai ser o filho formado em direito que meu pai precisa. Meu marido era um líder, um homem brilhante e muito culto.


CABANA DA PONTE

Tudo começou quando João Borges da Rocha Neto, nascido em 8 de maio de 1885, em Estância, filho de João Borges da Rocha Filho e de D. América Maria Rocha, deixam as terras sergipanas na década de 1910 e desembarcam na cidade de Ilhéus. Em busca de terras baratas e boas a plantação do cacau, seguem para o município de Itabuna, onde fixa residência por longo período tornando-se comerciante e fazendeiro de cacau. Tempos depois, pretendendo mudar de atividade, desejava se estabelecer na criação de gado, envia João Alves de Andrade e outros para comprar terras no sudoeste baiano. Após fechar negócio com alguns proprietários da região aos poucos foi comprando outras propriedades na circunvizinhança, na cabeceira do Rio Colônia. Borges e João perceberam que na área da mata, nada tinha na região para fornecer aos colonos e instalaram um pequeno comércio no meio da floresta, dando origem ao povoado de Itapuy, atual município de Itororó.

Quando o Coronel João Borges da Rocha Neto (seu sogro) faleceu, Sinval Palmeira, deputado cassado pelos militares em 1964, assumiu a administração da empresa Cabana da Ponte Agropecuária Ltda, localizada no Sudoeste da Bahia, na cidade de Itororó. A fazenda tinha mais de 5 mil hectares, era uma fazenda com mata, onde Sinval tentava implantar ideias conservacionistas que iam desde usar esterco como fonte de energia até evitar desperdícios, derrubada de árvores e o desvio de rios.

A partir de 1973, Sinval Palmeira (sucessor) incorporando todo o patrimônio construído por Borges da Rocha Neto, introduz muitas inovações, como a Central de Inseminação Artificial, com sêmen de touros de ato nível e tornou-se um expert na criação de gado (os rebanhos bovinos e de bubalinos da Cabana da Ponte ganham muitos prêmios em exposições). Sinval importou PO da Inglaterra, da Itália, Holanda e dos Estados Unidos para desenvolver a pecuária na região.

Em 1979, Sinval Palmeira esteve em Aracaju participando do I encontro de Médicos Veterinários do Nordeste (7 a 9 de novembro), realizado pela Somevesa. Época em que já se dedicava as atividades agrícolas e passou totalmente despercebido dos repórteres. Conseguir essa informação casualmente, através de uma foto de Sinval onde registrava a sua presença nesse evento, através da legenda da foto.

O IMPERADOR CHINÊS

A trajetória de Alsin-Giori Pu Yi (1906-1967), oficialmente como imperador Xuantong último imperador chinês imperial da Dinastia Qing. De 1908 até sua abdicação forçada em 1912 devido à Revolução Xinhai, no entanto foi permitido a Pu i continuar morando na Cidade Proibida, a sede imperial. Em 1917, com a tentativa de restauração da monarquia Pu Yi foi colocado novamente no tono, onde permaneceu por doze dias. Em 1924 quando as tropas do Kuomintang ocuparam Pequim, Pu Yi se refugiou na embaixada do Japão. Quando os japoneses ocuparam a Manchúria em 1931, Pu Yi ocupou o trono entre 1934 a 1945.

Após a derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial, a Manchuria foi devolvida aos chineses e Pu Yi capturado pelos soviéticos e deportado com toda a sua família para a Sibéria. Com a vitória comunista em 1949, liderada por Mao Tse-tung, Pu Yi é entregue a China e vive em um período para reeducação na China até 1959, ano no qual passa a ter uma vida comum em Pequim trabalhando como jardineiro no jardim botânico da cidade, e depois, como bibliotecário. Toda essa história foi transferida para o filme (Ítalo Franco) O Último Imperador, dirigido por Bernard Bertolucci em 1987.

Em 1961, Sinval Palmeira Vieira encontrava-se na China Comunista e teve a grande oportunidade de entrevistar o último imperador chinês:

Pequim – Quem imaginava ser possível falar com um ex-imperador, num país socialista, vivendo como qualquer cidadão, cuidando de suas plantas no Jardim Botânico da Academia de Ciências? Pois essa é a história de Pu Yi, último imperador chinês da dinastia Tchen. Homem de 54 anos, na melhor saúde, risonho, vestindo a blusa azul dos chineses, nos contou a história fantástica de sua vida. Foi imperador dos 3 aos 6 anos, sob o domínio da velha imperatriz Tson-Si, a mulher mais poderosa e despótica que a China conhecera. Era servido por mais de mil eunocos e mais de três mil serviram à velha imperatriz. Viveu no Palácio Imperial até os dezenove anos, sem conhecer a cidade de Pequim, onde nasceu. Só viu as ruas e parques dessa cidade única, quando passou a ser o simples cidadão Pu Yi.

Foi educado e dominou como um deus, um Buda vivo, descendia da deusa Fu-Ku-Lan, que, ao banhar-se nua rio, comeu um fruto vermelho que lhe trouxera um pássaro. E desse fruto proibido, num encontro bucólico entre deusas e pássaros, nasceu o primeiro imperador Tchin. Como Buda vivo, só prestava contas ao próprio deus em colóquios no Templo do Céu, hoje belíssimo parque aberto a todos os mortais. Mesmo depois de destronado continuou cercado dos cortesãos e altos funcionários, todos acumpliciados com o militarismo japonês. Convencido por eles que se travava contra sua vida, pediu asilo na embaixada do Japão, passando, nesse dia, a ser uma peça do plano nipônico de domínio e exploração da China. Durante sete anos viveu em Tien Tsin, nas concessões japonesas, onde foi preparada para o triste papel de imperador títere, tarefa que desempenhou a contento dos senhores, durante a ocupação japonesa do noroeste da China.

Os exércitos soviéticos ao invadirem a Manchúria o fizeram prisioneiro de guerra e nessa condição viveu na URSS cinco anos. Afligia-lhe a ideia de voltar à China e enfrentar um julgamento por seus crimes; por isso, três vezes escreveu a Stalin pedindo para viver na União Soviética. Em 1950, com outros prisioneiros de guerra foi entregue ao Governo de Pequim. Que lhe esperava na China? Prestou-se à restauração monárquica na China republicana, ligou-se aos agressores de seu país e a esses serviu na guerra, massacrando seu próprio povo, durante quatorze anos. Mais alto jamais atingiu delito de alta traição. Os chineses, no entanto, trataram-no com clemência, em lugar de fuzilá-lo mantiveram-no em campo de reeducação de prisioneiros de guerra e o transformaram no pacato senhor Pu Yi. Durante sua detenção, mostraram-lhe o mundo turvo em que vivera, destruíram-lhe os muito mandchus, fizeram-no ver as grandes obras em construção, as paradas cívicas, o povo alimentado e feliz; aquele mesmo povo que ele oprimira e que vivia esfarrapado e s alimentando de bolotas de carvalho. Revelaram-lhe a nova vida, criada e criadora, o novo mundo despontando como o sol, para aquecer e iluminar a todos. O último imperador Tchin, filho de uma deusa e deus ele próprio, se transformava no cidadão Pu Yi, trabalhador do Jardim Botânico da academia de Ciências e que, pela primeira vez, segundo nos disse, sente-se livre e seguro, dorme sem receio de atentado e passeia pelas ruas de sua bela cidade que só agora conhece e ama. As pessoas o saúdam como um homem da nova China e ele se confunde na multidão, feliz homem do povo, do grande povo chinês.

Está escrevendo suas memórias?

O encontro com esse último imperador mandchu, no falando do socialismo, deixa claro a excelência da filosofia penal chinesa: conjugar a pena com a clemência visando à recuperação do delinquente. O criminoso é criatura que reage em circunstâncias determinadas, movidas por motivos que por vezes lhe são estranhas. Em novas condições e com motivações diversas, pode vir a ser um cidadão útil. Tinha razão Tobias Barreto quando combatendo a teoria do criminoso nata, sustentava que se por um processo de seleção se pode modificar a cor da plumagem de uma ave, com maior razão, o caráter do homem.

O cidadão Pu Yi funcionário do Jardim Botânico da Academia de Ciências sorri tranquilo, fumando seu cigarro e contando seu conto de fadas. Nenhum homem, por certo, até hoje, percorreu a gama emocional de Pu Yi. De imperador criança, dominado pela imperatriz Tson-Si, a imperador fantoche do militarismo japonês. De prisioneiro de guerra, réu de alta traição a pacato cidadão de Pequim, em seu blusão azul e seu boné preto, falando da nova China e do socialismo como se houvesse ajudado a edificação da primeira comuna popular. Esse é o milagre da Nova China de Mao, esse prodigioso país surrealista. [3]

 GALERIA DE IMAGENS 
 








*GILFRANCISCO: jornalista, professor e escritor. Doutor Honoris Causa, concedido pela Universidade Federal de Sergipe – UFS. E-MAIL: gilfrancisco.santos@gmail.com

CRÉDITOS
[1] O Estado de Sergipe. Aracaju, Ano III, nº788, 10 de dezembro de 1935
[2] A Cruzada. Aracaju, Ano XVIV, nº 843, 27 de março de 1954.
[3] Folha Popular. Aracaju, Ano VIII, nº312, 11 de março de 1961.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário sobre essa matéria.

SINVAL PALMEIRA, O ADVOGADO DO PCB

  POR GILFRANCISCO* Comecei a recolher os artigos de Sinval Palmeira publicados na imprensa sergipana, a partir de 2004, quando localizei ...