III Roda de Leitura de São Cristóvão “Mulheres em poesia”



A III Roda de Leitura de São Cristóvão teve como tema “Mulheres em Poesia” e aconteceu na Biblioteca Pública Municipal Lourival Baptista no dia 22 de setembro de 2011. Foram selecionadas 2 poesias de Carmelita Fontes, Núbia Marques, Cora Coralina, Roseane Murrat, Giselda Morais, Vesta Viana e Cecília Meireles, interpretadas, respectivamente, por Maria Rita, Celestino, Rose Barbosa, Irani, Thiago Fragata, Eliene Marcelo e Maria Glória, coordenadora do evento. Segue imagens e conteúdo:

Maria Vesta Viana, artista plástica e poetisa

Praça São Francisco (Vesta Viana)

Olhei em plena madrugada

quando dormia o movimento.

Demorei num ponto parada

diante do pálido convento.

Vi o palácio calmamente

junto a Assembléia repousante

O orfanato hospitaleiro

em frente do velho cruzeiro.

Vi a linha colonial

Desta praça que é imortal

Só o sussurro diz sua glória

de filhos célebres na História.

Esqueci meu pensamento

olhando o belo firmamento

Ornado de nuvens prateadas

decorando esta madrugada.


Poesia de Vesta Viana foi interpretada por Eliene Marcelo (Balcão de

Informações Turísticas/PMSC)



Roseane Murrat

AMIGO (Roseane Murrat)

No rumo certo do vento,

amigo é nau de se chegar

em lugar azul.

Amigo é esquina

onde o tempo para

e a Terra não gira,

antes paira,

em doçura contínua.

Oceano tramando sal,

mel inventando fruta,

amigo é estrela sempre

no rumo certo do vento,

com todas as metáforas,

luzes, imagens

que sua condição de estrela contém.


JANELAS (Roseane Murrat)

Em todas as janelas mim debruço,

em todos os abismos

estendo uma corda

e caminho sobre o nada.

Também ando sobre as águas,

subo em nuvens,

galgo intermináveis escadas.

Abro todas as portas

e cavernas com um sopro

ou três palavras mágicas.

Mergulho em torvelinhos,

danço no meio do vento,

pulo dentro da tempestade.

Em cada encruzilhada mim sento

e tento arruma o destino,

estranho castelo de areia.


Poesias de Roseane Murrat foram interpretadas por Irani (CE Padre Gaspar Lourenço)



Gizelda Morais

PORTO/VISÃO (Gizelda Morais)

Meu olho mágico

Sobrepõe/superpõe

Meu olho fotográfico

Porto-visão

Meu olho fantasia

Meu olho medo

Meu olho história

Pré-história

Meu olho abatimento

Meu olho sonolento

Meu olho cego

Parado no tempo

Porto-visão passado.


Meu olho vigilante

Atento

Verniz corretor

Vidente

Sem lágrimas

Com lentes de contato/com lentes de aumento

Meu olho transparente

Voltado para frente

Porto visão futuro


Quero meus dois olhos

Juntos/separados

Sem traições/tropeços

É pouco ter dois olhos

Quero quatro

É muito ter dois olhos

Quero nada

Nem cega nem vidente

Ser ponto de interrogação

Porto-visão presente.


SEM PREDIÇÃO (Gizelda Morais)

O tênis de minha filha

Repousa na cadeira

Sem pés

De laços amarrados

Prontos para caminhadas

- por indo irão os pés

De minha filha/

Eu que não os botei no mundo

Mas que os conduzo agora

Por caminhos por mim selecionados?

- definirei o caminho

Com a minha mão

Segura à sua mão?

- que clareiras abrirão eles

Para mim também

Numa rota insuspeita?


O tênis de minha filha

Repousa na cadeira

Eu lhe sinto o espírito

Que anima os pés

Aquele jeito já

Aquela forma

Que deforma ou reforma

A “forma” original.


Poesias de Gizelda Morais foram interpretadas por Thiago Fragata (Museu Histórico de Sergipe/SECULT)



Cora Coralina


MÃE (Cora Coralina)

Renovadora e reveladora do mundo
A humanidade se renova no teu ventre.
Cria teus filhos,
não os entregues à creche.
Creche é fria, impessoal.
Nunca será um lar
para teu filho.
Ele, pequenino, precisa de ti.
Não o desligues da tua força maternal.

Que pretendes, mulher?
Independência, igualdade de condições...
Empregos fora do lar?
És superior àqueles
que procuras imitar.
Tens o dom divino
de ser mãe
Em ti está presente a humanidade.

Mulher, não te deixes castrar.
Serás um animal somente de prazer
e às vezes nem mais isso.
Frígida, bloqueada, teu orgulho te faz calar.
Tumultuada, fingindo ser o que não és.
Roendo o teu osso negro da amargura.

ASSIM EU VEJO A VIDA (Cora Coralina)

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

Poesias de Cora Coralina foram interpretadas por Rose Barbosa (Biblioteca Pública Municipal Lourival Baptista/PMSC)


Cecília Meireles

LUA ADVERSA

Tenho fases, como a lua

Fases de andar escondida,

fases de vir para a rua...

Perdição da minha vida!

Perdição da vida minha!

Tenho fases de ser tua,

tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,

no secreto calendário

que um astrólogo arbitrário

inventou para meu uso.

E roda a melancolia

seu interminável fuso!

Não me encontro com ninguém

(tenho fases como a lua...)

No dia de alguém ser meu

não é dia de eu ser sua...

E, quando chega esse dia,

o outro desapareceu...



DESPEDIDA

Por mim, e por vós, e por mais aquilo

que está onde as outras coisas nunca estão

deixo o mar bravo e o céu tranquilo:

quero solidão.

Meu caminho é sem marcos nem paisagens.

E como o conheces?- me perguntarão.

-Por não ter palavras, por não ter imagens.

Nenhum inimigo e nenhum irmão.

Que procuras? Tudo. Que desejas?-Nada.

Viajo sozinha com o meu coração.

Não ando perdida, mas desencontrada.

Levo o meu rumo na minha mão.

A memória voou da minha fronte.

Voou meu amor, minha imaginação...

Talvez eu morra antes do horizonte.

Memória, amor e o resto onde estarão?

Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.

(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!

Estandarte triste de uma estranha guerra...

Poesias de Cecília Meireles foram interpretadas por Maria Glória




Carmelita Fontes


INCERTA INCERTEZA (Carmelita Fontes)

Já não sei se te amei como devia
já não sei se te quis como eu queria
sei que te amei bem mais do que podia
mais tempo do que eu tinha para amar

Não sei se me esqueci pra te lembrar
não sei se me perdi pra te buscar
sei que te busquei mais do que sabia
menos do que se sabe pra encontrar

Não sei se te venci ou me venceste
não sei se te perdi ou me perdeste
no jogo que arrisquei pra te querer

Só sei que te perdendo sem cessar
um dia deixarei de te lembrar
um dia cansarás de me esquecer


BALANÇO (Carmelita Fontes)

Fiz a conta dos meus dias
quantos deles se perderam
fiz a conta dos meus sonhos
muitos nem aconteceram
fiz a conta dos meus passos
tantos rastros feneceram
fiz a conta das palavras
só poucas sobreviveram

Contei também os meus medos
alguns deles me venceram
contei também minhas lutas
os prêmios me entristeceram
contei também minhas dores
foram tantas - renasceram
contei também meus pecados
tantas cruzes floresceram

Fiz a conta dos meus vôos
era noite - interromperam
contei também meus segredos
era um só nem perceberam
fui contar os teus amores
tuas notas se perderam
fui contar os meus amores
as somas me enlouqueceram


Poesias de Carmelita Fontes foram interpretadas por Maria Rita (CE ELÍSIO FONTES)


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário sobre essa matéria.

AMANDO FONTES E O PROLETARIADO INDUSTRIAL

  GILFRANCISCO*   FORMAÇÃO ACADÊMICA O romance Os Corumbas, filia-se à corrente de romances nordestinos da geração de 32, que veio encarar...