Maria Vesta Viana, artista plástica e poetisa
Praça São Francisco (Vesta Viana)
Olhei em plena madrugada
quando dormia o movimento.
Demorei num ponto parada
diante do pálido convento.
Vi o palácio calmamente
junto a Assembléia repousante
O orfanato hospitaleiro
em frente do velho cruzeiro.
Vi a linha colonial
Desta praça que é imortal
Só o sussurro diz sua glória
de filhos célebres na História.
Esqueci meu pensamento
olhando o belo firmamento
Ornado de nuvens prateadas
decorando esta madrugada.
Poesia de Vesta Viana foi interpretada por Eliene Marcelo (Balcão de
Informações Turísticas/PMSC)
AMIGO (Roseane Murrat)
No rumo certo do vento,
amigo é nau de se chegar
em lugar azul.
Amigo é esquina
onde o tempo para
e a Terra não gira,
antes paira,
em doçura contínua.
Oceano tramando sal,
mel inventando fruta,
amigo é estrela sempre
no rumo certo do vento,
com todas as metáforas,
luzes, imagens
que sua condição de estrela contém.
JANELAS (Roseane Murrat)
Em todas as janelas mim debruço,
em todos os abismos
estendo uma corda
e caminho sobre o nada.
Também ando sobre as águas,
subo em nuvens,
galgo intermináveis escadas.
Abro todas as portas
e cavernas com um sopro
ou três palavras mágicas.
Mergulho em torvelinhos,
danço no meio do vento,
pulo dentro da tempestade.
Em cada encruzilhada mim sento
e tento arruma o destino,
estranho castelo de areia.
Poesias de Roseane Murrat foram interpretadas por Irani (CE Padre Gaspar Lourenço)
PORTO/VISÃO (Gizelda Morais)
Meu olho mágico
Sobrepõe/superpõe
Meu olho fotográfico
Porto-visão
Meu olho fantasia
Meu olho medo
Meu olho história
Pré-história
Meu olho abatimento
Meu olho sonolento
Meu olho cego
Parado no tempo
Porto-visão passado.
Meu olho vigilante
Atento
Verniz corretor
Vidente
Sem lágrimas
Com lentes de contato/com lentes de aumento
Meu olho transparente
Voltado para frente
Porto visão futuro
Quero meus dois olhos
Juntos/separados
Sem traições/tropeços
É pouco ter dois olhos
Quero quatro
É muito ter dois olhos
Quero nada
Nem cega nem vidente
Ser ponto de interrogação
Porto-visão presente.
SEM PREDIÇÃO (Gizelda Morais)
O tênis de minha filha
Repousa na cadeira
Sem pés
De laços amarrados
Prontos para caminhadas
- por indo irão os pés
De minha filha/
Eu que não os botei no mundo
Mas que os conduzo agora
Por caminhos por mim selecionados?
- definirei o caminho
Com a minha mão
Segura à sua mão?
- que clareiras abrirão eles
Para mim também
Numa rota insuspeita?
O tênis de minha filha
Repousa na cadeira
Eu lhe sinto o espírito
Que anima os pés
Aquele jeito já
Aquela forma
Que deforma ou reforma
A “forma” original.
Poesias de Gizelda Morais foram interpretadas por Thiago Fragata (Museu Histórico de Sergipe/SECULT)
MÃE (Cora Coralina)
Renovadora e reveladora do mundo
A humanidade se renova no teu ventre.
Cria teus filhos,
não os entregues à creche.
Creche é fria, impessoal.
Nunca será um lar
para teu filho.
Ele, pequenino, precisa de ti.
Não o desligues da tua força maternal.
Que pretendes, mulher?
Independência, igualdade de condições...
Empregos fora do lar?
És superior àqueles
que procuras imitar.
Tens o dom divino
de ser mãe
Em ti está presente a humanidade.
Mulher, não te deixes castrar.
Serás um animal somente de prazer
e às vezes nem mais isso.
Frígida, bloqueada, teu orgulho te faz calar.
Tumultuada, fingindo ser o que não és.
Roendo o teu osso negro da amargura.
ASSIM EU VEJO A VIDA (Cora Coralina)
A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.
Poesias de Cora Coralina foram interpretadas por Rose Barbosa (Biblioteca Pública Municipal Lourival Baptista/PMSC)
LUA ADVERSA
Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.
Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.
E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...
DESPEDIDA
Por mim, e por vós, e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão
deixo o mar bravo e o céu tranquilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces?- me perguntarão.
-Por não ter palavras, por não ter imagens.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras? Tudo. Que desejas?-Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!
Estandarte triste de uma estranha guerra...
Poesias de Cecília Meireles foram interpretadas por Maria Glória
INCERTA INCERTEZA (Carmelita Fontes)
Já não sei se te amei como devia
já não sei se te quis como eu queria
sei que te amei bem mais do que podia
mais tempo do que eu tinha para amar
Não sei se me esqueci pra te lembrar
não sei se me perdi pra te buscar
sei que te busquei mais do que sabia
menos do que se sabe pra encontrar
Não sei se te venci ou me venceste
não sei se te perdi ou me perdeste
no jogo que arrisquei pra te querer
Só sei que te perdendo sem cessar
um dia deixarei de te lembrar
um dia cansarás de me esquecer
BALANÇO (Carmelita Fontes)
Fiz a conta dos meus dias
quantos deles se perderam
fiz a conta dos meus sonhos
muitos nem aconteceram
fiz a conta dos meus passos
tantos rastros feneceram
fiz a conta das palavras
só poucas sobreviveram
Contei também os meus medos
alguns deles me venceram
contei também minhas lutas
os prêmios me entristeceram
contei também minhas dores
foram tantas - renasceram
contei também meus pecados
tantas cruzes floresceram
Fiz a conta dos meus vôos
era noite - interromperam
contei também meus segredos
era um só nem perceberam
fui contar os teus amores
tuas notas se perderam
fui contar os meus amores
as somas me enlouqueceram
Poesias de Carmelita Fontes foram interpretadas por Maria Rita (CE ELÍSIO FONTES)
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